O que o Japão tem contra tatuagens e o que isso tem a ver com Tóquio-2020?
Daniel Brito
Para os ocidentais, é mais um conceito de beleza e até de moda. Mas para os japoneses, é sinal de ofensa. A tatuagem vai ser um dilema durante os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de Tóquio-2020. E não é pelos motivos que o Comitê Paraolímpico Internacional apresentou nos últimos anos. Ainda se fosse, seria fácil de se resolver.
A polêmica toda gira em torno do estigma que tatuagens têm para o japonês. É uma história tão complexa quanto antiga. Basta lembrar que lá pelo século oito depois de Cristo, criminosos eram tatuados como forma de punição. Adiantando muito a história, trazendo para um passado mais recente, tatuagem era utilizada apenas por membros da Yakuza, a famosa máfia japonesa, ou pessoas ligadas a grupos criminosos.
Isso alimentou o imaginário popular por décadas, de tal modo que ainda hoje ainda há restrições em clubes, ginásios, academias e lugares públicos. Um repórter da renomada revista inglesa “The Economist” relatou que, em 2015, ficou constrangido por exibir uma tatuagem nas costas de apenas oito centímetros em uma piscina pública.
Na revista digital “Japan Style” há um depoimento de um americano que foi impedido de matricular-se em um clube desportivo porque, no formulário de inscrição, assinalou a opção “sim” quando perguntado se possuía alguma tatuagem. Em 2012, o prefeito de Osaka promoveu uma campanha para que todos os servidores públicos da cidade cobrissem suas tatuagens.
Até o astro inglês David Beckham cobriu-se nos jogos da Inglaterra na Copa do Mundo Fifa-2002 no Japão. Ele pediu à Umbro, fornecedora do English Team, camisetas de manga longa, assim, “escondia” a tatuagem em hindi com o nome de Victoria, mãe de seus filhos, cujos nomes também estavam marcados nos braços.
Não há uma lei específica, mas uma regra não escrita que condena as tatuagens aparentes. O que curioso porque o Japão tem um traço cultural muito forte nas tatuagens de corpo inteiro, chamadas de irezumi. Muitas delas trazem motivos de guerra, sangue, animais, florestas e mulheres.
Aos poucos, a cultura da tatuagem vai sendo difundida no país. Há, aproximadamente, cerca de três mil estúdios legalizados no país, muitos dos quais trabalham só com irezumi. Vinte e sete anos atrás, eram 300.
Os japoneses foram entendendo que tatuagem para os ocidentais não tinha a ver com a yakuza ou com gangsters, mas uma questão de estilo, às vezes até de etnia (como o caso dos maori, da Nova Zelândia). É improvável que os atletas sejam recomendados a esconder suas tatuagens durante Tóquio-2020.
E este pode ser mais um grande legado dos Jogos Olímpicos no próximo país sede: mudar o status das tattoos no Japão.