Ela ajudava a mãe na colheita do café, agora está no Mundial de handebol
Daniel Brito
Entre as gigantes da seleção brasileira comandada pelo dinamarquês Morten Soubak, que inicia a defesa do título mundial de handebol neste sábado, na Dinamarca, há uma mineira magrinha, mas ágil e cheia de energia. Bruna de Paula, 19, foi convocada pela primeira vez para a equipe adulta e, logo de cara, na competição mais importante antes dos Jogos do Rio-2016.
Ela atua como armadora e até a metade deste ano compunha a seleção brasileira juvenil. Foi lá que Soubak a viu e se encantou. Foi chamada para a equipe adulta sem escalas no time de juniores. Como dois terços do plantel que está na Dinamarca joga na Europa e disputou o Mundial da Sérvia, em 2013, Soubak confia que Bruna possa desempenhar o papel de elemento surpresa.
“Bruna tem um perfil diferenciado, como não tem muito peso e nem altura, penso que ela pode ser usada para contra-ataque, mas a ideia seria utilizá-la mais em ações no ataque mesmo”, explicou o treinador dinamarquês.
Mineira da pequenina cidade de Campestre, no sul do Estado, tem 1,70m de altura e pesa 58kg. Levou na bagagem para a Dinamarca uma história de vida simples e de trabalho pesado. Ela é a quarta filha de Dona Marinalva, que trabalha como catadora de café nas prolíficas fazendas da região. O pai saiu de casa quando Bruna tinha quatro anos, e eles quase não têm mais contato hoje.
Antes do handebol, ela ajudou a mãe em algumas temporadas de colheita de café. “Várias vezes ajudei minha mãe, é legal, é até gostoso. Mas a mão fica um pouco machucada, tem que usar luva, e tem uns bichinhos nas plantas também”, conta Bruna. Em setembro, reportagem de Roberto Salim na ESPN Brasil mostrou a vida da família em Campestre e contou que Bruna também vendeu picolé na infância e auxiliou em uma oficina mecânica.
A vida tomou novo rumo quando a garota franzina participou de uma espécie de peneira de handebol em São José dos Campos, em 2012. Ela já praticava a modalidade em Campestre, apenas como uma recreação, e decidiu acompanhar o grupo de meninas de Minas que fora fazer teste no Vale do Paraíba. Os treinadores gostaram do que viram e Bruna ficou por lá mesmo. “Se eu não tivesse entrado no handebol, estaria na colheita de café com a minha mãe, ou talvez nas ruas fazendo coisa errada”, avaliou a armadora do São José e hoje da seleção.
O handebol a levou para lugares que a vida em Campestre jamais a proporcionaria. Ainda aos 15, passou a disputar a liga nacional adulta pelo São José, viajou para Macedônia, China, Japão. Até Morten Soubak bancá-la no Mundial adulto da Dinamarca. “O Brasil não é uma fábrica de atletas de handebol, só no futebol que se fabrica muitos jogadores aqui. A Noruega é uma fábrica de handebol, a Dinamarca também. Eu vou acompanhando a base. Infelizmente, não temos muitos atletas para as seleções de base, por isso ela veio direto da juvenil para a adulta, provavelmente levará algumas pancadas no mundial”, avisou Soubak.
Ela já está sentindo isso. Já percebeu que o Mundial na Dinamarca será um tanto dolorido para a caçulinha da seleção. “Estou percebendo já pelos treinamentos, que são bem mais pegados, mais fortes, é muito diferente. Vai ser uma experiência que vou levar para toda a vida”, definiu Bruna.