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Arquivo : Revezamento da tocha

Está sendo gasto dinheiro público no revezamento da tocha?
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Daniel Brito

GO - Anapolis - 04/05/2016 - REVEZAMENTO DA TOCHA RIO 2016 - Revezamento da Tocha Olimpica para os Jogos Rio 2016. Foto: Rio2016/Fernando Soutello

Ginasta Rebecca Andrade em Anápolis, Goiás: prefeituras bancam evento (Fernando Soutello/Getty)

A resposta para a pergunta que dá título a esta nota é “sim, há dinheiro público no revezamento da tocha”. E a quantia deve superar os R$ 10 milhões, somando todas as fontes pagadoras: especialmente governo federal e prefeituras municipais. O evento é de propriedade da iniciativa privada, que tem na Nissan, Coca-Cola e Bradesco seus financiadores. Os custos da operação das três empresas no revezamento é mantido em sigilo.

Mas da parte do dinheiro público, só o governo federal bancou pelo menos  R$ 3.5 milhões. O restante saiu do caixa das prefeituras, após rápida pesquisa do blog nas páginas oficiais de 25 executivos municipais de sete unidades da Federação (cerca de R$1.8 milhão). Soma-se a isso os R$ 4.3 milhões gastos somente pelo Distrito Federal, primeira parada da tocha no Brasil, em maio. Aí chegamos a R$ 9.6 milhões. É natural que a conta aumente, dado que mais de 300 cidades serão visitadas no país até 5 de agosto, data da abertura dos Jogos-2016.

Foram contemplados com verba da União além de Brasília, 14 capitais (ES, BA, AL, RN, PI, TO, MA, AP, RR, AC, RS, SC, SP e MA). Foi repassado pelo MinC (Ministério da Cultura) a cada uma dessas cidades um limite máximo de R$ 250 mil.

De acordo com a assessoria de imprensa da pasta, entre 50% e 75% do valor total do projeto deveria ser destinado para custeio dos cachês dos artistas, grupos e bandas “reconhecidos como expoentes da cultura local e com trabalho de repercussão local e regional”. O restante deveria ser alocado em infraestrutura, recursos humanos e comunicação.

“O programa de celebração das cidades do revezamento da tocha prevê o apoio para a implementação de programação cultural durante a passagem da chama olímpica com apresentações artísticas, além da realização de feira de cultura alimentar, gastronômica e artesanato”, informou o MinC.

Justiça ainda faz as contas

RECIFE, BRAZIL - MAY 31: A runner carries the Olympic flame as security and onlookers follow on May 31, 2016 in Recife, Brazil. The Olympic flame will pass through 329 cities from all states from the north to the south of Brazil, before arriving in Rio de Janeiro on August 5, for the lighting of the cauldron for the Rio 2016 Olympic Games. The games will be held amidst an economic and political crisis in the country. (Photo by Mario Tama/Getty Images)

Segundo o Ministério da Justiça, 29 mil agentes de segurança estão envolvidos (Mario Tama/Getty)

Os ministérios do Esporte e  da Justiça também contribuíram com o custeio do revezamento. O Esporte não informou o valor dos gastos, já a Justiça, por intermédio da SESGE (Secretaria Extraordinária de Segurança de Grandes Eventos), ainda não fechou a conta. Mas explicou que um total 29 mil agentes de segurança serão empregados ao longo dos mais de 20 mil quilômetros que serão percoridos pela chama olímpica no Brasil. “Contamos, também, com equipes de inteligência e monitoramento nas mais diversas mídias e redes sociais”, informou a SESGE, por meio da assessoria de imprensa.

Brasília ganhou dobrado

BRASILIA, DF - MAY 03: Former Marathon runner Vanderlei Cordeiro passes the Olympic Torch to Paula Pequeno in Cathedral of Brasilia during the Olympic Flame torch relay on May 3, 2016 in Brasilia, Brazil. The Olympic torch will pass through 329 cities from all states from the north to the south of Brazil, until arriving in Rio de Janeiro on August 5, to lit the cauldron. (Photo by Handout/Getty Images)

Vanderlei Cordeiro (E) e Paula Pequeno em Brasília: cidade gastou mais que todas as outras (Getty Images)

O Ministério do Turismo contribuiu com R$ 250 mil ao Distrito Federal, ponto de partida do revezamento. Aliás, a capital federal ganhou duas vezes da União, com um total aproximado de R$ 500 mil, somando os aportes do Turismo e do MinC.

Um dia de passagem da tocha pelo DF custou R$ 4.3 milhões aos cofres públicos. O GDF anunciou que pouco mais de R$ 3.8 milhões foram de recursos próprios, dos quais R$ 2 milhões foram só em publicidade e promção do evento.

Jaú-SP fará de graça. Patos-MG por R$ 300 mil

A menos de 30 dias para a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos do Rio-2016, todos os Estados já receberam a tocha. O blog pesquisou no portal da transparência de diversas prefeituras e outras páginas oficiais sobre o investimento de cada município para receber o evento. Obteve informação em 25 delas. Acumulando um total de R$ 1.8 milhão. É sempre bom relembrar que este valor não vai para os patrocinadores ou para o Comitê Organizador: ele deve ser alocado na estrutura e promoção do revezamento.

Há, por exemplo, o caso de Jaú, São Paulo, em que o chefe do executivo local garantiu publicamente que a cidade não gastará um tostão para sediar o evento. Ipatinga, Minas Gerais, e Goiana, Pernambuco, desistiramde receber a chama considerando ser alto o investimento para a dimensão do acontecimento na cidade.

Em diversas localidades, a tocha não passa mais que uma manhã. São mais de 300 cidades a serem visitadas, e o comboio tem que passar sem perder tempo. Por isso, a estrutura do local deve ser fornecida pelas autoridades municipais.

Em Patos, Minas Gerais, o Ministério Público abriu inquérito para apurar o gasto de R$ 300 mil, dos quais R$ 133 mil seriam para grades de proteção. Porto Seguro, Bahia, também anunciou gasto semelhante. Já em Ijuí, Rio Grande do Sul, terra do ex-técnico da seleção, Dunga, a prefeitura anunciou investimento de R$ 10 mil.

Em junho, meu amigo e companheiro de UOL Esporte, Adriano Wilkson, revelou que o governo do Pará desembolsou R$ 21 mil para que o lutador Lyoto Machida carregasse a tocha em Belém.

O jornal Gazeta, do Espírito Santo, compilou o investimento de todas as cidades que receberam o evento no Estado e chegou-se a um total de R$ 197 mil distribuídos em seis municípios.

Ainda restam cinco Estados e mais de 100 cidades até o fim do revezamento.

BRASILIA, BRAZIL - MAY 03: Detailed shot of the Olympic Torch during the Olympic Flame torch relay on May 3, 2016 in Brasilia, Brazil. The Olympic torch will pass through 329 cities from all states from the north to the south of Brazil, until arriving in Rio de Janeiro on August 5, to lit the cauldron.

(Getty Images)


Joaquim Cruz volta para casa com a tocha e jovens se perguntam: ‘É famoso?’
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Daniel Brito

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Estudantes esperam Joaquim Cruz sob o sol seco e forte de Taguatinga (Daniel Brito/UOL)

Joaquim Cruz era esperado por muitas crianças nos canteiros da Avenida Central de Taguatinga. Escolas públicas e particulares desta cidade-satélite de Brasília liberaram os estudantes para ir às ruas para ver o campeão olímpico nascido naquelas cercanias. O comboio atrasou-se em mais de 90 minutos e o público esperou debaixo de sol forte e seco que castigava Taguatinga.

O dono da medalha de ouro nos 800m nos Jogos Olímpicos de Los Angeles-1984 conhece bem aquele clima. Foi por ali, em Taguatinga, que ele começou a praticar o atletismo. Não havia pistas decentes à época, ele corria no barro vermelho ou, para refrescar-se, em meio às árvores da Floresta Nacional.

Sempre que perguntava de sua perseverança de manter-se atleta ante tamanhas adversidades que Taguatinga lhe apresentava nos idos de 1970 e 1980, ele respondia: “Perseverante é minha mãe, que deixou o Piauí com seis filhos pequenos para tentar uma vida nova em Brasília”.

Joaquim está radicado nos Estados Unidos há mais de 30 anos, mas nunca deixou Taguatinga para trás. Mantém o Instituto Joaquim Cruz com o programa Rumo ao Pódio Olímpico (voltado para o alto rendimento) e o Clube dos DescalSOS (na área social) em dois centros esportivos do DF.

Veio especialmente de San Diego, Califórnia, onde vive, para ser homenageado com o desfile carregando a tocha olímpica por 200m na entrada de Taguatinga.

Não havia manifestantes contra os Jogos Olímpicos ou o impeachment da presidente Dilma Rousseff, apenas ansiedade nos canteiros taguatinguenses.

Um grupo de jovens garotas de 16 anos, liberadas da aula desta tarde de terça-feira, aguardava a chegada do revezamento na Avenida Central de Taguatinga e se perguntava.

– Será que Gabriel Medina [surfista paulista, campeão do circuito mundial em 2014] vai carregar a tocha em Taguatinga?

Eu estava ao lado das jovens e respondi:

– Não, não é Medina quem conduzirá a tocha aqui. Mas um cara com muito mais história no esporte …
– Quem é?, perguntou uma das adolescentes.
– Joaquim Cruz, anunciei.
Ao que, elas me perguntaram, em uníssono:
– E ele é famoso?

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Em que pese o desconhecimento desse grupo de jovens estudantes, Joaquim Cruz foi ovacionado na entrada de Taguatinga. Ele recebeu a tocha apagada, caminhou um pouco e cumprimentou o público que o chamava pelo nome atrás do cordão de isolamento.

Acendeu a tocha com a ajuda de um grupo de apoio, caminhou com passos rápidos e não se conteve, começou a correr. Um trote leve, um sorriso largo e uma gritaria tremenda ao seu redor.

Um drone, que está proibido pela organização, fez imagens aéreas da passagem de Joaquim pela Avenida Central. Uma aglomeração de fotógrafos e cinegrafistas rompeu o cordão de isolamento dos policiais e rodeou Joaquim. Ele ficou protegido apenas por uma equipe de seguranças vestidos com uniforme da organização do revezamento, que corria ao lado do campeão olímpico.

Após 200m que esgotaram-se em pouco mais de um minuto, o campeão passou o fogo olímpico adiante. Como em uma grande onda, a multidão continuo a correr, deixando o taguatinguense para trás. Ele foi levado por seguranças para um ônibus ao fim do comboio. Falou rapidamente com jornalistas.

– Esse é o momento do esporte, o momento do povo brasileiro. A chama está acessa, disse com sua característica voz calma, e entrou no ônibus, quase que empurrado pelos seguranças.

 

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